Certos de que já sabiam quais usinas de cana-de-açúcar ofereciam risco de calote, os investidores do mercado sucroalcooleiro foram surpreendidos nesta semana com uma notícia improvável. Um tradicional grupo do setor, com dívidas ou equacionadas ou em processo avançado de negociação, decidiu pedir recuperação judicial. O grupo Antonio Ruette Agroindustrial, controlado pelo octagenário Antonio Ruette de Oliveira, protocolou na última terça-feira um pedido de proteção contra credores na Vara de Monte Azul (SP), alegando incapacidade para honrar suas dívidas.
No entanto, conforme documentos protocolados na Justiça, a empresa, que detém duas usinas no Estado, tinha um índice de liquidez que mostrava solidez: para cada R$ 1 de dívida a pagar no curto prazo, o grupo tinha a receber R$ 1,01.
A Justiça ainda não tomou uma decisão sobre o pedido. Mas, a possível recuperação já está virando uma grande briga judicial. Com a assessoria do escritório Santos Neto Advogados, o fundo americano Amerra Agri Opportunity, o banco holandês ABN AMRO e a ED&F Man Capital Markets protocolaram uma petição para evitar que o pedido da Ruette seja aceito. O advogado Domício Santos Neto afirmou que outros credores se organizam em bloco para fazer o mesmo. Ainda hoje, segundo ele, BTG Pactual e o Banco BBM vão se juntar ao time.
Santos Neto afirmou que as informações prestadas pela própria empresa à Justiça não indicam falta de liquidez. “O grupo informava R$ 50 milhões em caixa, R$ 198 milhões em estoques e um índice de liquidez acima de 1″, afirma. Na sua avaliação, a empresa tem a intenção de usar o Judiciário para forçar os bancos a reverem seus créditos em uma posição mais enfraquecida.
“Há dez dias, o grupo recebeu empréstimos dos credores de R$ 20 milhões, após apresentar informações financeiras auditadas que mostravam solidez. Após esse aporte, cancelaram todos os contratos de exportação de açúcar com as tradings, que eram usados como garantias dessas operações”, conta o sócio do Santos Neto, Fernando Ferreira.
Os cálculos feitos até agora, segundo ele, indicam que os contratos envolviam um volume de 162 mil toneladas da commodity, fixadas ao preço de US$ 361 por tonelada. “Atualmente, o produto está sendo negociado no mercado futuro a US$ 308 por tonelada, o que significa que a própria companhia perdeu mais de R$ 20 milhões somente ao cancelar contratos”, disse Ferreira.
Na visão de alguns agentes que atuam no mercado sucroalcooleiro, com objetivo de obter alguma vantagem perante os credores, o grupo vai se autodestruir, prejudicando todos os demais envolvidos, como funcionários e produtores de cana.
Fontes próximas ao grupo sucroalcooleiro acreditam que Antônio Ruette de Oliveira, hoje com 86 anos, decidiu pela recuperação judicial diante do receio de o patrimônio da família ser afetado por uma eventual perda de controle da situação financeira do grupo.
Esse temor se intensificou com os desdobramentos do caso do Grupo Virgolino de Oliveira (GVO), controlado pelos netos de Carmem Ruette de Oliveira, irmã de Antônio Ruette de Oliveira. Com um endividamento impagável, o GVO ofereceu nos últimos anos como garantias a empréstimos grande parte do patrimônio da família, tais como terras. A condição, segundo fontes, estaria causando ao núcleo familiar um grande desconforto, do qual Antonio Ruette de Oliveira é testemunha.