Na análise de um pedido de recuperação judicial, o cerne da questão não é a natureza jurídica do agente econômico, mas o impacto da sua atividade nos aspectos culturais, econômicos, sociais e educativos. Agentes que prestam serviços de inegável relevância social e econômica devem ser contemplados pelo instituto da recuperação judicial.
Assim, a Vara Regional Empresarial de Porto Alegre autorizou o processamento da recuperação judicial do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul. A decisão também suspendeu bloqueios e outros atos executivos contra a entidade e lhe deu um prazo de 60 dias para apresentar um plano de recuperação.
O instituto é um centro de assistência médica, ensino e pesquisa especializado em cardiologia. Nos últimos anos, seu déficit financeiro, relativo a obrigações trabalhistas e dívidas com fornecedores, chegou a R$ 257 milhões.
Conforme o laudo de constatação prévia, o instituto concentrou 51,4% dos atendimentos de cardiologia via SUS em Porto Alegre no último ano. Atualmente, a entidade opera 947 leitos e possui 4 mil funcionários distribuídos em cinco hospitais.
Quanto ao ensino, o instituto já formou 1.080 residentes, 263 mestres e 110 doutores em cardiologia, além de 2.712 técnicos em enfremagem. Também já publicou mais de 1.975 artigos científicos e mais de 5.635 temas livres.
A entidade é constituída como uma fundação. O juiz Gilberto Schäfer destacou que, conforme precedente do Superior Tribunal de Justiça, a inscrição no registro de empresas determina apenas a regularidade de uma atividade e não serve para caracterizá-la como empresária.
“Em uma análise sistêmica, é necessário alargar a interpretação normativa de empresa”, concluiu o magistrado. Para ele, a atividade do instituto tem relevância concreta. Além disso, o laudo técnico constatou o impacto social da atividade.
Segundo Schäfer, o serviço público de saúde e ensino feito pelo instituto “é de alta relevância pública”. Assim, “o êxito da recuperação e de sua reestruturação certamente passarão por diálogos institucionais relevantes”.
Na decisão, o juiz também determinou que o laudo de constatação seja enviado à ministra da Saúde, Nísia Trindade; aos secretários estaduais e municipais das áreas envolvidas; e às comissões parlamentares federal, estadual e municipal de saúde.
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Processo 5245072-73.2023.8.21.0001
Fonte: ConJur