STJ exclui banco de recuperação judicial

STJ exclui banco de recuperação judicial

Por Joice Bacelo | De São Paulo

O Itaú BBA, braço de investimentos do Itaú Unibanco, conseguiu reverter, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), uma decisão de segunda instância que o obrigava a fazer parte do processo de recuperação judicial da construtora Engefort. A discussão envolve um crédito de cerca de R$ 8 milhões – quantia que o banco havia concedido à empresa em troca de títulos que ela tinha a receber.

Há divergência entre as partes, nesse caso, quanto à natureza da operação. O Itaú defende que se trata de uma cessão de crédito “pura e simples”. O banco afirma, no processo, ter comprado títulos que a empresa tinha a receber. Teria, dessa forma, antecipado o pagamento à companhia e recuperado o dinheiro na data em que ela originalmente seria quitada.

Já a Engefort argumenta tratar-se de cessão fiduciária – também conhecida como trava bancária. Nesse caso, a empresa teria tomado crédito no banco e oferecido como garantia ao pagamento os títulos que tinha a receber. A empresa alega que o contrato não foi registrado em cartório até o processamento da recuperação judicial e esse seria um dos requisitos para que tais créditos não se sujeitassem ao processo.

A Justiça de Goiás, onde tramita o processo de recuperação da Engefort, acolheu a argumentação da companhia. E, como os valores já haviam sido descontados, o banco foi condenado a devolver o dinheiro para a conta da empresa. Pela decisão, para receber o montante ao qual teria direito, o Itaú BBA deveria se habilitar dentro processo de recuperação como credor quirografário (classe sem garantias, geralmente a última a receber).

Em decisão monocrática, a ministra Maria Isabel Galotti entendeu, porém, que a discussão sobre a natureza da operação – se cessão simples ou cessão fiduciária – não tem força para interferir no resultado do julgamento. Segundo o seu entendimento, a cessão fiduciária, ao contrário do que defende a Engefort, não depende de registro em cartório para ter validade.

A ministra detalha, na decisão (Recurso Especial n° 1.444.873), que há previsão sobre a obrigatoriedade do registro no Código Civil, mas somente aos casos que envolvem “propriedade fiduciária de coisa móvel infungível”.

A regra muda, no entanto, quando se trata de cessão de crédito. Isso porque existe legislação específica sobre o tema. Nessas situações, afirma a ministra, aplica-se a Lei do Mercado de Capitais (n° 4.728/65), que não exige o registro em cartório para que se concretize a propriedade ou titularidade fiduciária.

Maria Isabel Gallotti citou duas outras decisões do STJ com esse mesmo entendimento. Ambas julgadas pela 3ª Turma (AREsp 1009521/AL e REsp 1592647/SP). “A transferência ao credor fiduciário se efetiva a partir da contratação e, por esse motivo, os bens não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, sem quebra da expectativa dos demais credores da recuperanda”, frisou a ministra.

Advogados que atuam para instituições financeiras afirmam que o entendimento do STJ leva em conta o dia a dia dos bancos. “Essas são operações de rotina, que ocorrem com frequência. Não faz sentido determinar o registro em cartório. É uma burocracia que não se justifica e só encarece o custo da operação”, diz um dos profissionais.

É uma vitória importante, sobretudo, porque fora dos processos de recuperação, as instituições financeiras recebem integralmente os seus créditos. Dentro do processo, as condições de pagamento podem ser alteradas por deságios, prazos de carência e parcelamentos.

Para as empresas em crise, por outro lado, a notícia é ruim. A Lei de Recuperação Judicial e Falências (n° 11.101, de 2005) prevê a exclusão dos credores de garantias fiduciárias dos processos de reestruturação das companhias e a aplicação do Código Civil a esses casos era uma das poucas chances que as devedoras tinham para a inclusão.

O advogado Miguel Ângelo Sampaio Cançado, que representa a Engefort no processo, afirma que a empresa vai recorrer da decisão. Ele considera arbitrária a atitude do Itaú de levantar o dinheiro, e diz que o saque foi feito diretamente da conta da Engefort, correntista do banco, quando a empresa já estava em processo de recuperação.

“Naquele momento existia decisão judicial que proibia qualquer saque na conta da empresa e isso não foi respeitado. O Itaú quebrou, inclusive, a regra de igualdade entre credores”, acrescenta o advogado.

Quando ingressou com o pedido de recuperação judicial, em julho de 2012, a Engefort tinha dívidas superiores a R$ 200 milhões. O processo teve início na 9ª Vara Cível de Goiânia e atualmente tramita na 15ª.

A aprovação do plano, em assembleia-geral de credores, ocorreu em 2015, mas ainda hoje é questionado na Justiça. A decisão mais recente é do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, que suspendeu os seus efeitos ao julgar uma ação que havia sido ajuizada pela União.

A empresa, até a decisão do STJ, contava não só com a devolução dos R$ 8 milhões como também com a correção desses valores. A quantia seria usada para o pagamento de credores.

Advogados do escritório Boccuzzi Advogados Associados, que representaram o Itaú BBA no caso, foram procurados pelo Valor, mas não se manifestaram sobre o julgamento. O Itaú Unibanco também não deu retorno até o fechamento da edição.

Fonte: Valor Econômico

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